Exames do 4.º ano: "Não
venham dizer que correu bem"
In Público, 07/05/2013
O pai de Inês diz que "não é a inventar formalismos absurdos que se preparam os alunos" Paulo Pimenta
Depois de
semanas de críticas, tudo parece estar a postos para o primeiro dos dois exames
do 1.º ciclo. Mas, segundo os pais, só à custa do "sacrifício das
famílias".
Esta
terça-feira, quando as carrinhas da câmara começarem a percorrer as diversas
aldeias de Cinfães para apanhar os 137 alunos que vão fazer exame do 4.º ano à
sede do concelho, o bulício já será grande à porta da EB 2,3. Os 700 estudantes
que ali costumam ter aulas, do 5.º ao 9.º anos, estarão a ser encaminhados para
autocarros para fazerem visitas de estudo no Porto e em Coimbra. "Se tudo
correr bem, nem se vêem uns aos outros. Antes das 9h saem os 700 e, pouco
depois, entram os 137 - foi a solução que encontrámos para garantir condições
para que os mais pequenos possam fazer o exame de Português em sossego",
dizia ontem Manuel Pereira, director daquele agrupamento de escolas.
Mesmo assim,
em Cinfães haverá crianças sem aulas - as das escolas básicas de 1.º ciclo cuja
única professora terá de acompanhar os alunos do 4.º ano à escola-sede do
agrupamento, para o exame. Serão algumas, mas poucas - nada que se pareça com
os 500 alunos do 5.º ao 9.º anos, que esta manhã deviam ter aulas na EB 2,3 de
Gaia, mas ficam em casa, para que a escola possa acolher os 300 do 4.º ano que
ali fazem exame de Português. O director, Filinto Lima, reconhece que "é
muito aborrecido" e lamenta "o transtorno e a perda das aulas".
"Ainda assim", garante, "os pais foram compreensivos"
quanto à solução encontrada para corresponder às orientações do Ministério da
Educação e Ciência, que indicou que hoje e sexta (dia em que se realiza a prova
de Matemática) as escolas deviam congregar no mesmo espaço, nomeadamente na
sede do agrupamento, os alunos que estreiam os exames no 4.º ano, que não se
realizavam há quase três décadas.
"É o
caos - a complicação gerada por este exame é absolutamente injustificável e
prejudica milhares de famílias: as dos mais de 107 mil alunos que vão fazer
exame hoje e na sexta e também as dos que nesses dias não podem ter aulas. Mas,
como sempre, com a boa vontade, o esforço e o sacrifício de todos, tudo se vai
resolvendo, tudo se vai encaixando...", comentava ontem o presidente da
Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap). Jorge Ascenção. Não o
dizia com alívio: "No ano que vem (se é que há exames do 4.º para o ano,
depois desta confusão) não aceitamos nada de parecido. Espero que daqui a uns
dias não apareça alguém do Governo a dizer que "afinal não houve problema
nenhum" e que "tudo correu bem", como se nada disto fosse
grave", disse.
Desde Março
que os representantes das associações de directores, dos pais e das câmaras
(que acabaram por assegurar o transporte de quase todos os alunos) alertam para
os mais diversos problemas. "E de cada vez que há uma notícia no Telejornal,
mais uma criança perde o sono ou fica com dores de barriga, tal é o stress",
comenta Fátima Pereira, de 32 anos, mãe de Pedro, um dos alunos que hoje, às
9h30, agarrarão na caneta preta para fazer o seu primeiro exame.
Residente em
Cinfães, Fátima diz que o filho e os colegas andam em sofrimento por causa da
pressão imposta, também, pela professora, que lhes disse que quem tivesse zero
no exame chumbava. No colégio privado que Inês França frequenta, em Coimbra,
nenhum professor sugeriu tal coisa "para incentivar os alunos", mas a
mãe, Rute Ferreira, nota que o nervosismo dos professores e dos miúdos é maior
do que nos anos anteriores. "Basta dizer que o meu filho mais velho fez as
provas de aferição e teve A a Matemática e A a Português sem nunca ter passado
pelo stress que a Inês está a viver com os exames. E o que é que ela
ganha com isto? Experiência? Nada! Apenas uma pilha de nervos", comenta.
Fátima e Rute
têm apoiado os respectivos filhos no estudo, tentando desdramatizar um eventual
desaire, provocado pelo nervosismo, por exemplo. O mesmo tem feito Noémia Malva
Novais, mãe de Daniel, que frequenta um colégio privado, em Coimbra. Critica,
para além dos "formalismos ridículos", "a obrigatória deslocação
a outra escola".
Teresa
Valdiviesso, de Lisboa, tem uma experiência diferente: depois de ter comprado
vários livros com exercícios de antigas provas de aferição para ajudar a filha
a preparar-se, reconhece que talvez esteja mais ansiosa do que ela. Já ouviu:
"Calma, mãe! O exame só vale 25 por cento!"
Teresa
considera que "a substituição da prova de aferição por um exame, com toda
a carga que isso implica, é importante para a auto-responsabilização".
Acredita que "quanto mais cedo a filha aprender a enfrentar os problemas
da vida real, melhor", uma perspectiva muito diferente da de Rui Martins,
que dirige a Confederação Nacional Independente de Associações de Pais (CNIPE)
e diz que "não é a inventar problemas e a criar formalismos absurdos que
se preparam os alunos". Ele próprio, conta, já teve de ir a duas reuniões,
na escola, para preparação do exame que a filha, Inês, vai fazer. "Faz
algum sentido colocar esta pressão sobre os pais que, sem querer, a transmitem
aos filhos? ", pergunta. E responde: "Nenhum. Não faz sentido
nenhum".
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